Artículo dedicado al Día de los dos Padres y dia de San José en España
19 de marzo.
19 de marzo.
Em 1926 Getúlio Vargas foi eleito deputado federal e a partir daí foi consolidando seu avanço político até ser eleito presidente do Brasil por processo indireto em 1934 e tornar-se um ditador em 1937, quando iniciou-se o período histórico do Brasil denominado Estado Novo. Ainda nesse ano Washington Luís foi eleito pelo voto direto à Presidência da República com pouco mais de 688 mil votos e com a larguíssima margem de 99% dos votos, embora com o comparecimento de apenas 2% da população. Em setembro deste mesmo ano foi promulgada a reforma da Constituição de 1891, houve um golpe de Estado em Portugal, o partido fascista italiano torna-se partido-estado e as células do nazi-fascismo e do anti-semitismo já vão se formando na Alemanha de Hitler. Nesse mesmo ano de 1926 nasceram o comediante Jerry Lewis, a Rainha da Inglaterra Elisabeth II, a atriz Marilyn Monroe, o filósofo Michel Foucault, o escritor Carlos Heitor Cony, o grande líder cubano Fidel Castro e muitas outras figuras importantes na história mundial. As Olimpíadas estavam em sua 8ª edição e ainda não havia a premiação dos Oscar pela indústria do cinema. Chuá, Chuá, música antológica brasileira de Pedro de Sá Pereira e Ari Pavão, gravada por muitos artistas e em várias versões, mais recentemente por Xitãozinho e Xororó encabeçava a lista dos sucessos do ano juntamente com "Ave Maria" de Bach/Gounod interpretada por Vicente Celestino, o carioca da voz Orgulho do Brasil.¹
Foi nesse cenário político e cultural que nasceu meu pai em agosto de 1926, oitavo filho de uma família de doze irmãos. Viveu a infância e parte da juventude numa pequena propriedade rural da família no interior do Rio Grande do Sul. Cursou só o ensino primário e ajudava a família trabalhando com os pais e irmãos. Ao cumprir os 18 anos partiu para Porto Alegre para alistar-se ao exército e, felizmente a Segunda Guerra Mundial já havia acabado, porque se os tivesse cumprido dois ou três anos antes talvez teria sido levado a juntar-se à Força Expedicionária Brasileira. Naquela época, engajar-se no exército era uma das poucas oportunidades para os jovens que pretendiam sair de seus povoados no interior e tentar uma vida na cidade grande. Muitos dos meus tios, seus irmãos, seguiram a carreira militar.
Ainda bem jovem, depois de servir ao exército andou um pouco pelo Brasil, Rio de Janeiro, mais especificamente e lá fez alguns trabalhos. Minha mãe mantêm até hoje as cartas que recebia dele, enquanto ainda eram noivos e ele estava longe. Mais tarde, voltando ao Rio Grande do Sul, casou-se em 1956 e foi trabalhando como motorista de táxi, motorista particular, representante comercial, comerciante e viajante que começou os primeiros tempos de sua vida profissional e de casado.
Ele tem até hoje uma letra bonita, com as maiúsculas muito desenhadas própria de quem era exigido fazer caligrafia, um exercício para ter uma escrita bonita e legível, tema obrigatório e que era dado muita ênfase nas escolas da época. Meu pai também sempre teve grande habilidade para os cálculos que fazia mentalmente, sem erros, nos longos anos em que trabalhou com comércio próprio onde aliava seu espírito empreendedor com a sensatez para os negócios. Teve primeiro um bar-armazém, tipo as mercearias de hoje, depois, por longos anos uma loja de produtos para agricultura e medicamentos veterinários e por último, antes de se aposentar, auxiliava minha mãe que estava a frente de um pequeno bazar de artigos de decoração e presentes. Lembro de auxiliá-lo no balanço anual com os produtos agropecuários e veterinários, quando ainda não tínhamos as calculadoras digitais e as caixas registradoras não eram obrigatórias. Lembro apenas de uma pequena máquina de somar, mas creio que ele usava só para confirmar a soma mental que fazia das muitas linhas com os valores dos produtos discriminados. Posteriormente, tudo era entregue bem caprichado ao contador em folhas de papel-almaço.
Não conheci outro homem mais ligado à família do que ele. Jamais saía sem minha mãe e os filhos. Nunca fazia programas sozinho ou com amigos fora de casa, o que não indica genericamente um valor ou um defeito, mas um espírito que escolheu livremente pela dedicação à família. Nas horas livres usava seu tempo no cuidado da casa, jardim, gramado, consertava coisas, pintava e tinha habilidade com estofaria. Nunca o vi subir o tom de voz em brigas, reclamações ou expressar preconceito ou discriminação a nada, nem a ninguém. Responsabilidade, respeito, honestidade, delicadeza, atenção e um trabalhador incansável sempre foram seus pontos fortes.
Foi o primeiro homem feminista que conheci, mas foi depois de muitos anos que percebi essa qualidade no caráter dele. Os muitos conceitos de feminismo falam em promover a afirmação, investir de poder e liberar as mulheres dos padrões patriarcais, mas meu pai, além disso ele antevia a igualdade de gêneros. Lembro que ele levantava de noite e me dava xarope para tosse ou AAS infantil diluído na água numa colherinha. Em muitas fases da nossa vida, minha mãe mantinha uma empregada, mas lembro dele cozinhar, levar a família para passear nos fins-de-semana, nos comprava livros, roupas e nos tomava os pontos da escola. Lembro que um dia queria escrever para minha avó, antes de entrar para a escola, mas apenas conhecia as letras e ele me ditou o texto.
Durante as décadas de 60, 70 na minha infância e adolescência o mundo passava por uma série de transformações, o avanço do feminismo, o movimento hippie, a contracultura, o descontentamento popular com guerras, conflitos e governos, o movimento negro, os embates raciais e sociológicos e as palavras dele eram sempre de respeito ao ser humano, à condição feminina de minha mãe, suas filhas, mãe e irmãs, embora politicamente não fosse engajado, como a maioria do povo não era. Quando irrompeu a ditadura militar e o golpe de Estado em 1964 ele já estava casado, com duas filhas e outra prestes a nascer. Deste ano, pouco tenho lembranças, somente de alguns fatos pontuais como andar em um carro grande e verde que ele tinha para trabalhar de taxista, brincar em frente a um sobrado branco das ruas do bairro em que morávamos, de assistir desenho animado numa televisão novinha em folha na casa de uma tia, de ganhar um anel de pedra vermelha e visitar no hospital minha mãe que acabava de ter sua terceira filha, um bebê gordinho com uma carinha muito vermelha num dia de calor naquele março de 1964.
Enquanto meu pai esteve estabelecido com comércio, minha mãe foi sempre a sua parceira, pois trabalhavam e planejavam juntos. Jamais o vi atuar para impor sua vontade ou passar por cima das liberdades dela ou minimizar a inteligência e o valor que minha mãe agregava ao seu trabalho.
Só depois de adulta constatei também que meu pai sempre foi um feminista mesmo sem saber, mesmo não militante, pois eu não percebia que havia a supremacia do homem nas famílias e na sociedade. Quando passei a conviver com colegas de escola e frequentar outras casas fora da família, percebi o quanto a figura do homem era tida como autoridade máxima, com as mulheres em sua grande maioria, realizando exclusivamente serviços domésticos, assumindo a criação dos filhos e com o homem no centro do poder. Nossa casa era cheia de mulheres, com um único irmão bem mais novo e eu não fazia diferença entre a autoridade de minha mãe e a de meu pai e nunca percebi atitudes machistas da parte dele. Meus pais sempre compartilharam a nossa educação, as tarefas, o trabalho e as decisões. Minha mãe nunca foi uma mulher submissa, ao contrário, às vezes era até criticada por alguns membros da família por manter uma relação mais igualitária com o marido.
Ele nunca submetia a família à ordens extremamente autoritárias ou sem fundamento e exercia sua autoridade de pai na medida do exemplo e da sensatez, embora naquela época em que éramos crianças não houvesse diálogo, as relações familiares eram mais formais e a pedagogia era tarefa para a escola. Mesmo assim nunca batia nos filhos, ainda que fosse uma época que surras e castigos à crianças eram vistos com muita normalidade e faziam parte da educação. Aos filhos foi um incentivador inesgotável da necessidade do estudo e de seguir uma profissão, dando-lhes liberdade para trilhar seus caminhos e escolhas, embora nem tudo fosse de seu acordo. Como nunca é. Hoje, depois dos filhos adultos é um avô e bisavô ainda mais apaixonado.
Creio que o feminismo em um homem só nasce de um temperamento justo, decente, ético, inteligente e generoso. Um homem precisa dessas qualidades para ser feminista. Meu pai é um feminista não só porque esteve ao lado de minha mãe nas tarefas domésticas, na criação dos filhos e nas decisões da família, mas porque reúne todas as qualidades de um homem íntegro que evoluiu com o tempo, com as mudanças sociais, científicas, políticas, de pensamento e de convivência humanas. Definitivamente é um exemplo a ser seguido pelos netos e bisnetos que já estão sendo ou serão um pouco dele no futuro, estendendo seus feitos, prolongando seu caráter e sua memória.
F E L I Z D I A D O S P A I S, P A I.💖
Cada palavra, frase, parágrafo lido vai delineando uma pessoa muiiiito especial, à qual tive a sorte de conhecer e conviver por um período, na minha adolescência, talvez não muito longo, mas que deixou marcas e lembranças profundas em mim...Sim, Seu Alamir, como eu chamava, era de uma bondade extrema, impossível descrever...O retrato de um paizão, que para época, era coisa rara. Quantas vezes nos levava e buscava das festinhas, boites, aniversários, sempre pronto, com aquele ar de confiabilidade. Paciência era o que não lhe faltava! Seu jeito manso, educado, amoroso com a família e comigo, amiga das gurias, Eliane e Rosane. Naquele tempo, era comum pais extremamente autoritários, machistas, cheios de preconceitos, que usavam maus tratos com os filhos e esposa. Lembro tão bem de como eu gostava de passar horas e horas na companhia daquela família que me acolhia quase todos os dias, com alegria, sorrisos, brincadeiras...acho que era tudo que me faltava.
ResponderExcluirNão tinha pressa de ir pra casa, lá tudo era tão calmo...Foi um tempo que sobrevivi, talvez pelo carinho, acolhimento, amizade com a família Brum. Todos, bem guardadinhos no meu coração, porque contribuíram para que eu me tornasse essa pessoa que sou hoje. Tantos momentos de leituras, críticas, questionamentos, sonhos, ideais, vivenciamos...Hoje, tenho certeza que seu Alamir já era muito sábio. Compreendia nossos impulsos próprios da adolescência e mais, pelo seu exemplo, de honestidade, bondade, respeito, responsabilidade, mostrava-nos caminhos.
Gratidão, seu Alamir e D. Neiva! Tenho lembranças maravilhosas d vocês!!!
Engessando Eliane, tuas palavras, A figura de um Pai Feminista!
ResponderExcluirObrigada, Janice. Dia desses uma prima me perguntou quantas lágrimas tinha derramado escrevendo esse texto e eu disse que nenhuma, porque o ato de escrever já me desafogava. Agora lendo teu comentário, sim, me emocionei! Obrigada pelo testemunho!
ResponderExcluirEliane, eu sim, me debulhei em lágrimas enquanto lia esta história que me trouxe um passado distante, ao mesmo tempo tão presente e vivo, cheio de muitas emoções...lembranças de um tempo conflituoso, porém suavizado pela convivência com pessoas tão especiais...D. Neiva, na sua simplicidade era o protótipo do bom humor; enquanto Seu Alamir assumia a postura de equilíbrio, seriedade...Aos meus olhos, tudo perfeito!
ResponderExcluirChorei! Eliane, estou ficando velhinha e chorona kkkk....Tio Alamir, amoroso, compreensivo, acolhedor, querido. O Lalá, hehehe...sempre foi maravilhoso ir pra casa de vcs. Muito amor por todos! Saudades!
ResponderExcluirQue bom te ver aqui, Cris! Testemunha ocular, companheira de juventude e irmã mais nova, sempre parte da família.Muita saudade também! Beijos.
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