Era agosto de 2019 e tínhamos iniciado uma viagem desde a Galícia até a Andaluzia, comunidades autônomas da Espanha, passando por várias cidades portuguesas e espanholas. Fazia parte do roteiro uma visita à cidade de Tanger no Marrocos, atravessando o Estreito de Gibraltar no Mar Mediterrâneo desde o Porto de Tarifa. Tínhamos reservado os bilhetes com antecedência no sítio denominado GetYourguide e a reserva incluía a travessia de ida e volta de barco, translado em ônibus dentro da cidade e passeio a pé com guia local e almoço.
O porto marítimo de Tarifa parece um mini aeroporto com amplas salas para espera, embarque e desembarque de passageiros, controle de metais e de imigração feitos pela Polícia Nacional Espanhola. Embarcamos às 10 horas de um domingo num confortável e enorme barco de passageiros que a empresa turística chama de balsa, porque transporta pessoas e veículos.
A balsa era super confortável com assentos estofados dispostos em dois largos deques envidraçados com todo o serviço de bordo desde bares, lojas de souvenirs, sanitários e salas de entretenimento. Era um dia de sol pleno e a visão do mar durante a travessia pelo Estreito era impressionante. O trajeto tem cerca de 30 quilômetros e o tempo de viagem foi de mais ou menos uma hora.
Depois de desembarcar no Porto de Tanger e passar pelos controles de imigração e verificação de passaportes fomos recebidos pelo guia local. Ele nos agrupou, subimos num ônibus e fomos conhecer primeiro uma parte alta da cidade onde se localizam alguns órgãos de governo, parques, residências oficiais e alguns bairros mais nobres da cidade. As vias são muito bem arranjadas e nota-se o forte sentimento nacionalista, pois uma das avenidas portava de longe em longe e dos dois lados da via as bandeiras vermelhas com a estrela verde do Marrocos, hoje uma monarquia constitucional.
A primeira parada foi nas Cuevas de Hércules, um conjunto de cavernas e grutas antigas que, segundo a cultura popular estaria ligada ao mito do deus grego.
A gruta tem uma abertura para o mar que, segundo a lenda, barcos fenícios que aportavam ao continente africano criaram esta abertura com a forma do continente africano. A abertura na gruta nada mais é que um produto da erosão produzida pelos ventos, pelo mar e também por uma antiga atividade humana de extração de pedras das paredes para a construção de moinhos. Hoje não está mais permitido tocar, tampouco extrair nada do lugar que se transformou em famoso ponto turístico da cidade. O nome Cuevas de Hércules vem de outra lenda que conta que o mito grego pernoitou nestas grutas antes de terminar seus doze trabalhos.
Durante o passeio de ônibus fizemos também uma parada numa praia onde se podia admirar os dromedários que descansavam na areia e por dois euros era possível dar um pequeno passeio montado num desses animais, mas devidamente puxados por seus tratadores.
Depois do passeio de ônibus fomos deixados no centro histórico da cidade para continuar o trajeto a pé pelo meio da Medina, como é chamado o bairro antigo das cidades muçulmanas, sempre com a companhia e as orientações em espanhol do guia local.
A Tanger antiga tem uma emaranhada arquitetura. É um verdadeiro labirinto de ruazinhas estreitas e não muito limpas em terreno inclinado com muitas das ruas formadas por degraus. As edificações são geralmente de dois ou mais pavimentos pintados de branco ou azul claro. Os fios de eletricidade se enredam entre os pequenos prédios. Ao longo do trajeto encontra-se todo tipo de comércio, mas o que vi mais foram barbearias, fruteiras e pequenos cafés de mau aspecto. Suas paredes e pisos parecem estar recobertos de uma sujeira antiga.
Há muitos vendedores ambulantes oferecendo souvenirs, roupas, quadros, echarpes, relógios e artigos eletrônicos. Eles são bastante assediadores com os turistas, insistem na venda, colocam seus produtos quase no rosto dos clientes, não desistem fácil, mas não são desrespeitosos.
Na hora do almoço fomos para um restaurante típico no primeiro andar de um pequeno prédio. Éramos um grupo de mais ou menos trinta pessoas e fomos dispostos em mesinhas baixas retangulares para seis lugares com os assentos em forma de bancos compridos e almofadados. O salão tinha as paredes pintadas com desenhos coloridos típicos da cultura marroquina e havia uma pequena orquestra tocando ao vivo.
No cardápio não podia faltar o delicioso cous-cous marroquino, um cozido de cordeiro com verduras e a farinha de milho especial que faz parte da receita. Havia espetos de frango, servido assim mesmo, um espeto de metal para cada pessoa com pedaços de frango assado. A sobremesa era um pequeno biscoito doce, as bebidas, água ou refrigerante e no final um chazinho quente de folhas parecidas com melissa ou hortelã. Tudo com um sabor diferente do que jamais tinha experimentado.
Após o almoço seguimos com a visita e o guia nos levou para conhecer um bazar de artesanato local onde havia coleções coloridas de tecidos, tapetes, lenços e vestidos típicos. Também visitamos um herbolário, onde assistimos uma pequena palestra com o responsável-técnico mostrando as propriedades do óleo de argan, planta típica da região. Ali havia uma infinidade de potes de cremes, xampus, sabonetes, óleos, etc... e todos aproveitaram para umas comprinhas. Obviamente essas paradas fazem parte de um pacote acordado pelos agenciadores de turismo com o comércio local.
Depois de comprar alguns cremes, óleos milagrosos e muitos lenços multicoloridos paramos para ver um encantador de serpentes, aquele típico senhor de barbas brancas e turbante para o qual os turistas também deixaram algumas moedinhas em uma cesta que era recolhida por uma menina.
Ao final do passeio à pé fomos deixados em meio de uma pequena praça cheia de gente para um tempo livre. Perto dali aproveitamos para tomar um café, mas a cafeteria não tinha bom aspecto e se não me falha a memória o café foi servido num copo.
Ali também havia muito assédio de ambulantes e crianças oferecendo produtos. O lugar era movimentado, com aspecto sujo e descuidado, embora houvesse hotéis em volta e turistas chegavam em carros de luxo. Essa foi a pequena mostra que tive da desigualdade social no Marrocos. Depois de muitas fotos e explicações do guia, retornamos ao porto para tomar o barco de volta à Tarifa. Foram oito horas que passaram como se fossem oito minutos.
Um dia gostaria de voltar a Tanger.
Gostei de sentir os ares de Tanger através das tuas palavras... penetrar no mundo marroquino, conhecer um pouco da cultura e costumes daquele povo. Belo passeio!
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