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Mostrando postagens de dezembro, 2023

É só um número

É só mais um ano que acaba e outro que começa. Dia 1º de janeiro será um dia normal. A grande diferença é a ressaca pela mistura de cerveja e espumante e o remorso pelos exageros na comida. De novidade, só uma agenda ou um calendário diferente trazido de brinde de um supermercado. Salvo os que estarão de viagem em janeiro ou fevereiro, estes manterão o entusiasmo e a ansiedade no topo e no final voltarem para suas rotinas dias depois cansados de tanta atividade de lazer e pouco descanso. Será só mais um dia depois do outro, com a diferença que há festejos e rituais variados conforme o continente, o país e a região. Alguns tampouco têm a mesma contagem de tempo do ocidente. Segundo o fuso horário, as ilhas de Kiribati e Samoa inauguram o Ano Novo e ele vem vindo do Leste para o Oeste, fazendo o mesmo trajeto fantasioso do Papai Noel, mudando a folhinha de país em país. Coisas boas e coisas ruins vão acontecer em 2024. Crianças vão nascer e pessoas vão morrer. As guerras, as doenças, os

Sinais Fechados

Certo dia ouvi dizer que não há necessidade de encontrar com as pessoas, porque já estamos informados de tudo pelas redes sociais. No momento até concordei, mas depois me pus a pensar. E os abraços? E as conversas? E o "quanto tempo", "eu vou bem", "eu vou indo"? como na música "Sinal Fechado" de Chico Buarque. No entanto, a rede social é o topo do iceberg na vida de todos. O que acontece na realidade não está ali(aqui). Dores, tristezas, dificuldades, doenças, fracassos, enfim a vida real está invisível assim como se mantém invisíveis milhares de pessoas que apenas seguem perfis e vice-versa e não compartilham nada. A invisibilidade é outro ponto que venho tratar aqui.   Curiosamente, acho que há uma conexão entre os invisíveis que, por falta de tempo, de vontade ou por falta de manejo com a tecnologia etc. sejam os mesmos que se esquivam dos encontros.  Eles se distraem com a exposição alheia, mas nunca se expõem. Saber se fulano parece bem

O paradoxo das meninas

               As duas irmãs de Renoir- Global Gallery   L aura tinha um sonho recorrente desde a infância. Sonhava que sua mãe corria assustada com ela no colo em meio a uma mata escura, depois elas subiam as escadas e embarcavam num imenso avião. No sonho, ela tinha a sensação de que viajavam para longe e abandonavam uma vida. Cresceu sem o pai. Só sabia que ele vivia na Espanha. A menina percebia que o assunto desagradava a mãe que refletia no rosto um misto de pesar e pânico sempre que perguntava por ele. Tinha uma vaga memória de um homem jovem, bonito, de olhos azuis que brincava com ela e levava para passear. Depois de crescida, ela começou a insistir com a mãe para saber os detalhes de sua origem, cujo fato mais relevante que sabia era que elas tinham emigrado daquele país, quando tinha pouco mais de três anos. A mãe, depois de muita insistência de Laura, já adolescente, contou uma história: —Quando tu tinhas uns dois anos teu pai sofreu um acidente no barco pesqueiro em qu

2023

    Parque da Redenção, Porto Alegre, arquivo pessoal Uma frase  "Se você expressar o que habita em você, isso irá salvá-lo.    Mas se você não expressar o que habita em você, isso irá destruí-lo".   (Jesus- Evangelho de São João) Um sonho “Que todas as crenças religiosas sejam respeitadas, e até mesmo a não crença religiosa. Que possamos comungar na crença da humanidade, da diversidade, do bem comum. Que seja declarada justa toda forma de amor. Que nenhuma mulher seja alvo do machismo estrutural. Que a juventude negra não seja alvo do extermínio. Que Marias Eduardas não sejam assassinadas dentro da escola. Que Marquinhos da Maré não sejam assassinados indo para a escola. Que Marielles possam chegar em segurança nas suas próprias casas. Que todo agricultor tenha uma terra para plantar, que todo sem-teto tenha uma casa para morar. Que os indígenas sejam respeitados nas suas crenças. Que as fronteiras acabem e as armas caiam no chão. Que a felicidade venha sobre nós, respeitand

Distopia verde-amarela

Foto: Sérgio Lima/AFP Crônica classificada, destacada e publicada pelo Prêmio Off Flip 2023 Dois de novembro de 2022, dia de sol pleno. Moro perto de um quartel. Saio para a caminhada matinal e noto inúmeros veículos estacionados na minha rua que não costuma ser muito movimentada. Vejo muitas pessoas vestidas de verde e amarelo ou enroladas em bandeiras do Brasil indo em direção ao prédio do Exército. Homens, mulheres e até crianças cheias de acessórios nas cores do país, um cenário meio carnavalesco, porém sem a alegria do samba. Pelo contrário, as expressões eram fechadas, cenhos franzidos.  Quando chego à esquina e me deparo com o inusitado, me pergunto em voz alta:    —Mas o que é isso? — um senhor sentado na entrada de seu prédio me ouve e faz um alerta: "A senhora não passe por ali, é perigoso!” Então entendi que o perigo era pós-eleitoral. Os vencidos tinham fechado a rua em frente ao quartel e pediam intervenção militar . Ou seria federal? Não havia muita coerência no uso

A chave 24

Foto: Unplash Imaginemos ter todas as chaves para poder abrir todas as portas que gostaríamos no ano que se aproxima. Mas antes disso é necessário fechar algumas que insistem em continuar abertas. A porta dos Desenganos seria renomeada para porta do Esquecimento. Dores, perdas, agonias e culpas ficariam ali encerradas e a chave jogada fora, mesmo conscientes que nunca esqueceremos absolutamente todo o conteúdo. Não é difícil imaginar quais chaves gostaríamos de ter nas mãos para abrir as portas de 2024. Objetivos tangíveis como trabalho, dinheiro, viagens e bens intangíveis como saúde, conhecimento, amor, amizades, seriam os mais desejados. Estas palavras desgastadas, usadas em todas as mensagens de final de ano, afinal  são o que mais necessitamos para ser feliz e encontrar um sentido para a vida. Talvez encontrar o sentido já seja a própria felicidade. Encontrar o amor, este bem tão antigo quanto o mundo, também é um dos mais necessários. O problema é que tem uma chave muito escondid